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Nota Biográfica

Nota Biográfica

fundador museu terra miranda

António Maria Mourinho nasceu em Sendim (concelho de Miranda do Douro), a 14 de fevereiro de 1917, filho de João da Cruz Mourinho e Ermelinda Rosa Pires.

Embora filho de gente humilde, conseguiu prosseguir os seus estudos no Seminário Diocesano de Braga, entre 1930 e 1941, tendo concluído os estudos neste ano e consequentemente ordenado presbítero a 29 de junho.

Também desde jovem manifestou dois fortes impulsos, um que o levou a fazer os votos sacerdotais e outro, mais próprio do “mundo”, que o fez estudar e conhecer com profundidade a Cultura da sua terra.

Estas duas áreas, por sinal compatíveis e complementares, já exemplificadas pela ação de muitos outros sacerdotes (como o Abade de Baçal, seu amigo e mentor) que aliaram o seu ministério ao conhecimento da História, da Arqueologia e da Etnologia, fizeram do Pe. Mourinho um dos mais elevados expoentes da Cultura Mirandesa de sempre.

Não é de estranhar, portanto, que tenha assumido as disciplinas de História e Apologética no mesmo Seminário Maior onde se havia graduado; e que na paróquia rural de Duas Igrejas (e em todo o Planalto Mirandês), tenha desenvolvido as suas capacidades de guia espiritual e de intelectual.

A sua missão em Duas igrejas, onde permaneceu durante 42 anos como pároco, foi fulgurante tanto em obras pastorais como em obras culturais, sendo ainda hoje recordado por todos com muita saudade.

Padre António Maria Mourinho na Festa da Vila Chã da Ribeira, em 1979

Desde os 18 anos, no seu próprio dizer, se interessou “pela observação e investigação de tudo o que tem interesse cultural nesta região do Nordeste Português, por inclinação meramente natural ou vocacional que sempre o atraiu com satisfação. A etnografia, o folclore, a arqueologia, o dialeto, a arquitetura tradicional, os costumes, ocuparam sempre a melhor parte dos tempos livres da sua vida”.

Começou por interessar-se de forma curiosa e despreocupada, mas com o decurso dos anos a sua “missão” cultural foi-se acentuando, numa manifesta ansiedade e certeza em que o valor da identidade seria absolutamente necessário para defender o futuro das gentes do Planalto Mirandês.

A posição como sacerdote facilitou muitíssimo a ação cultural e, em parte, quase não se conseguiam distinguir estas duas “ferramentas” com que trabalhou junto das diversas comunidades. As portas de casa franqueavam-se ao Padre, que também era amigo e ou mesmo familiar, mas a faceta de estudioso era também apreciada e respeitada. Muitas eram as pessoas que voluntariamente, com legítimo afeto e consideração, traziam “novidades” de achados arqueológicos, ou que mostraram com felicidade os seus tesouros de linho e lã, tecidos em teares centenários, ou as simples alfaias agrícolas.

Nesta “pesquisa” tão natural quanto a vontade de conhecer a terra e as gentes (que se traduz num ato de amor genuíno), foi recolhido um extraordinário conjunto de materiais, parte deles pertencentes à esfera do Património Imaterial, e que podemos considerar terem sido “salvos” num tempo muito oportuno, em que muitos dos valores da ancestralidade vivida pelas gentes de Miranda estava à beira de uma transformação acelerada e de perdas inevitáveis.

Além de ter passado à escrita muitas canções, “cascos” (peças de teatro popular), rimances, provérbios, contos e lendas tradicionais, e outras tradições, parcialmente editados; também identificou alguns sítios arqueológicos e recenseou muitos testemunhos de diversos povos que fizeram do Planalto Mirandês a sua casa.

Um dos achados mais emblemáticos foi feito em 1974, quando, em dois abrigos da serra de Mogadouro, na “Fraga da Letra”, detetou algumas pinturas rupestres.

Não se cingindo às observações e prospeções mais ou menos sistematizadas no campo e junto da população (limitadas, contudo à disponibilidade que poderia ter da sua principal atividade), mesmo assim ainda estabeleceu uma aturada correspondência com diversos eruditos, de onde avulta a figura do Abade de Baçal, sacerdote e historiador bastante mais velho, mas que lhe serviu de grande exemplo. Ambos partilhavam um grande amor pela Cultura (popular e erudita) específica da região transmontana. Foi esse mesmo ensejo que o fez percorrer muitos arquivos, não só os das paróquias a que teve acesso, mas também em outros em Portugal e Espanha.

Nos anos subsequentes à sua ordenação, certamente motivado pelo ciclo de grandes celebrações nacionais vividas em Portugal desde 1940, e fruto da sua dedicação à investigação, intensifica a atividade editorial, passa a pertencer a instituições de referência.

António Maria Mourinho condecoradoApenas com 26 anos (a 31 de março de 1943), é galardoado pelo então Presidente da República, General Óscar Carmona, com o grau de Oficial da Ordem Militar de Cristo.

A sua entrega à causa mirandesa fê-lo um dos elementos mais empenhados do Grupo do “Ressurgimento Mirandês” (1945), em conjunto com uma série de outras figuras gradas sociedade, cultura e política local de então, como o Conselheiro António Carlos Alves. Este grupo, além de ter pugnado pela reabilitação das tradições locais, teve um papel fulcral no desenvolvimento dos programas das celebrações do IV Centenário da elevação de Miranda do Douro a cidade, efeito que se repercutiu por bastante tempo. Foi também por esta altura a ideia de criação de um museu começou a fazer sentido, contudo as iniciativas foram direcionados para áreas mais práticas, sendo de destacar a fundação do Grupo Folclórico Mirandês de Duas Igrejas (Pauliteiros de Miranda), criado também nesse ano.

Através dos Pauliteiros, Miranda foi sendo sucessivamente conhecida e aclamada. De facto, se chegar a Miranda era uma aventura considerando as vias de comunicação existentes, então fez-se o contrário, levou-se a cultura mirandesa a toda a parte, sobretudo onde havia portugueses emigrados ou como forma de promoção de turismo no país e no estrangeiro. Os pauliteiros foram, assim, a quatro continentes, percorreram diversos países da Europa (Espanha, França, Alemanha, Suíça, Áustria, entre outros) África (Angola), América (Estados Unidos e Canadá) e Ásia (Hong Kong e Macau).

O reconhecimento da importância cultural e turística do folclore mirandês, tão específico no contexto mundial, foi uma constante, sempre entusiasticamente aplaudido e recebendo diversos prémios, dos quais avulta o Prémio Europeu de Arte Popular concedido em 1981. Permaneceu na direção do Grupo Folclórico Mirandês de Duas Igrejas (Pauliteiros de Miranda) até ao dia 1 de dezembro de 1991, retirando-se desta função por motivos de saúde.

Entre 1970 e 1975 frequentou a Universidade do Porto, onde se licenciou em História com 16 valores.

Em 1975 recebeu da Direção Geral do Património Cultural uma bolsa de estudo para prosseguir investigações na área da arqueologia e no seguimento da identificação de pintura rupestre na “Fraga da Letra” (Mogadouro).

Posteriormente veio a identificar outras estações arqueológicas, como o Abrigo Rupestre da Solhapa, com cinco painéis de insculturas (classificado como Imóvel de interesse público); a estação Luso-Romana de Saldanha (Mogadouro), “onde foram encontradas várias lápides funerárias, sendo uma de grande valor arquelógico-histórico, a ara votiva a JUPITER DEPULSOR, a segunda aparecida em Portugal mas esta dedicada por um veterano da celebre Légio VII Gemina, que deu o nome à cidade Espanhola de Leão”; a estação luso-romana de Atenor (Miranda do Douro), também com várias lápides funerárias de interesse; e outra em Sanhoane (Concelho de Mogadouro).

Seguindo de perto os estudos do Abade de Baçal, sobretudo após o seu falecimento a 13 de novembro de 1947, identificou na região mais de meia centena de inscrições funerárias e votivas luso-romanas.

Em 1977 recebeu uma bolsa de estudo da referida Direção Geral do Património Cultural, dedicando-se, desta feita, a investigações de natureza sócia antropológica: “A sobrevivência de comunitarismo agro-pastoril” e “Sobrevivência de trabalhos manuais em ferro forjado”, coligindo um volume designado de “Cancioneiro Tradicional e Danças Mirandesas”, publicado em1984.

Em 1978, recebeu nova bolsa de estudo do Estado Português, continuando diversos estudos sobre o “Ferro Forjado, o Comunitarismo Agro-Pastoril, O Cancioneiro Tradicional, O Conto e a Lenda Tradicional Mirandeses, O Teatro Rural…”.

António Maria Mourinho, com o passar dos anos, tornou-se uma figura incontornável do panorama cultural mirandês. À medida das suas capacidades constituiu uma notável biblioteca, composta por vários milhares de volumes, presentemente entregues como fundo próprio à Biblioteca Municipal de Miranda do Douro, que recebeu o seu nome em homenagem.

Participou em inúmeras atividades culturais e científicas, quase sempre convidado como orador, em Portugal e Espanha, país vizinho, mas não estranho, que também soube honrar a estatura cultural e integridade do Pe. Mourinho. É curioso notar que, do outro lado da fronteira, instituições importantes como a Universidade de Salamanca, Museu de Zamora e outras, não só conhecem esta figura, como também guardam a memória da sua importante obra, sentindo-o, por vezes e com propriedade, que este investigador transmontano também marcou o panorama cultural da raia espanhola.

São quase incontáveis os escritos do Pe. Mourinho, tanto em livros, como em artigos e separatas. Destacam-se, entre outras, as seguintes obras: “Nôussa Alma i Nossa Tiêrra” (poesia mirandesa), “Guerra do Mirandum” (base para o guião de um filme), “Fundação do Castelo de Algoso”; “O Abrigo Neolítico da Solhapa”; “Epigrafia Luso-romana, aparecida entre Douro e o Sabor”, “Documentos Medievais Portugueses em alguns Arquivos de Espanha”; “Grupo Folclórico Mirandês de Duas Igrejas (Pauliteiros de Miranda) – Prémio Europeu de Arte Popular /81”; “Cancioneiro Tradicional e Danças Populares Mirandesas”; “Terra de Miranda – Cousas e Factos da Nossa Vida e da Nossa Alma Popular”, etc.

Além dos títulos publicados e que são sobejamente conhecidos como obras basilares para o estudo da Cultura mirandesa, acrescem todos os outros escritos, ainda não editados (maiores ou menores), por vezes meras (mas preciosas) anotações (como que para futuras edições revistas), que se espera poderem ser consultados e finalmente editados após uma década de entrega a instituições públicas. Além deste manancial escrito, hoje à guarda do Centro de Estudos António Maria Mourinho (sedeado no edifício da Biblioteca Municipal de Miranda do Douro), também aí existe um bom espólio de imagens que ilustram muitas das atividades desenvolvidas ao longo de uma vida (também ainda em fase de tratamento) e que permitirão, logo que estejam acessíveis ao público e investigadores, conhecer melhor o passado recente e a personalidade do Pe. Mourinho.

Da atividade como sacerdote, salienta-se não só o seu ministério junto da comunidade de fiéis, mas também uma constante preocupação para com o património religioso coletivo. Procedeu a intervenções de conservação e restauro em diversos templos e procedeu à ereção da Capela de santo Isidro Lavrador, inaugurada a 21 de novembro de 1961.